segunda-feira, 5 de julho de 2010
ESTAR EM...
A partir deste documento de processo, como chama Cecilia Salles,venho registrar o processo de pesquisa em Composição Coreográfica I, disciplina do curso de Dança da Faculdade de Artes do Paraná sob orientação da professora Rose Rocha.
Este trabalho tem relação direta com o que foi proposto no primeiro bimestre, porém o aprofundamento veio do que ficou mais forte da primeira experiência. Continuei com a relação do corpomídia, isto é, um corpo intrinsecamente ligado com o espaço que está inserido. Utilizando alguns toques da própria proponente, resolvi levar para a mostra do processo em aula o que já vinha acontecendo em outros ambientes. O que houve foi surpreendente, pois meu corpo agiu de forma “inesperada” e “desconhecida” em alguns momentos. A estratégia foi a seguinte, num primeiro momento eu me movimentaria a partir do que meu corpo já tinha como familiar (lembrando a questão de raízes), passado esse momento as pessoas que estavam em volta podiam interferir com problematizações que seria exteriorizada de forma verbal, porem caberia somente a mim me mover a partir de tal problema, isso é, a escolha de como me relacionaria com tal informação partiria da minha seleção. Gostaria de deixar claro que, por mais que não me movimentasse a partir de algum problema proposto o mesmo interferia no corpo, já que venho expondo a relação corpo/ambiente.
Após ler o texto “O processo de criação em dança como processo de comunicação” de Cleide Martins percebi que parte do trabalho trás grande relação com improvisação. A autora do texto diz que toda improvisação necessita de uma dosagem de liberdade e de uma dosagem de determinação. Cleide cita determinação como condições anatomofisiológicas, gramáticas já existentes no corpo, estilo pessoal e hábitos. O que me faz lembrar as raízes citadas no primeiro bimestre, raízes essas que limitam e ao mesmo tempo possibilitam novos movimentos. Porém um corpo que dança, e não somente, está inserido no tempo real, e com isso aparecem incertezas, dificuldades, dúvidas que proporcionam um lugar onde não esteja tudo determinado.
Termino então reconhecendo que a improvisação neste processo aparece como forma de estar em relação com o espaço, forma de atualização e acordo com o ambiente.
Mariana Alves
O PERCURSO do Gato - Caroline Natalie Stroparo
Neste processo, eu dei a luz a personagem Bárbara. Muito espirituosa, intensa, calculista, manipuladora, ela traz à cena um jogo de sedução, resguardo e ataque. A imagem do gato foi se construindo naturalmente, até que um dia, Hany Morgenstern, minha diretora cênica falou: “...ela se move como um gato, pensa como um gato!”. Em paralelo, então surgiu na Faculdade de Artes do Paraná, na disciplina de Composição Coreográfica, ministrada pela professora Rosimere Rocha, a pesquisa de movimento tendo o foco a coluna vertebral. Eu que só organizava os movimentos felinos focando os apoios, vi ali um novo âmbito para pensar essa movimentação e dar-lhe novas possibilidades.
Trata-se de uma linguagem corporal que me era e está sendo muito útil para o processo de concepção da Bárbara, linguagem que estou aprofundando ao mesmo tempo que diversificando. Assim, eu fiz o meu recorte, de um trabalho complexo voltado para o psicológico humano, para uma observação e aproximação relacional com a criatura que considero a mais fascinante de todas, o gato. Não pretendo abstraí-lo aqui, a Bárbara naturalmente já se fez e se faz assim. Também não é um trabalho de representação, mas sim, de uma aproximação relacional propositada, para que se possa atingir um estado corporal muito específico.
Em minha etapa anterior, minha pesquisa chegou aos estudos da técnica do Le Parkour. Isso se dava vista as quatro rotinas que pude organizar baseada em minhas observações da Mimi, minha gata, já relatadas no texto anterior. O percurso é o parkour do gato. No entanto, nos meus experimentos, eu pude me deparar a uma barreira psicológica. Nas minhas leituras sobre o Le Parkour, eu constatei que esta barreira é natural do ser humano, e que sua técnica baseia-se muito além do simples condicionamento físico, mas a um condicionamento mental, a um pré-movimento, a uma pré-disposição para a ação.
Compreendi que a minha limitação de traçar percursos como a um gato, estava no fato de que o estado corporal não estava ainda forte o bastante para tal. Não se trata de um corpo não similar, mas sim de um corpo sem convicção. Embora a aproximação relacional do gato com o ambiente seja por demais delicada e complexa, eu compreendi que agir a ação estava mais ligada ao pensar e organizar, do que me aliar aos gestos. Procurar assemelhar-me foi muito útil para o começo do processo que caminhava para este patamar, mas também sabia que não seria suficiente por muito tempo.
Antes de criar e cumprir percursos, eu precisava me aproximar de algo mais sutil, procurar a lógica do mundo sob o olhar de um gato. É preciso aprimorar o foco, aprimorar o olhar. Isto também me disse minha diretora cênica: “é preciso se apropriar do foco do gato para que os movimentos repentinos deste aconteçam!”.
Além da investigação deste foco corpo e visão propriamente dita, eu adotei a relação do contato físico do gato com o ambiente. Como será que ele pensa o espaço? O que lhe interessa deste? Como ele interage? Como se impulsiona?
No fim das contas, o ultimo questionamento continua sendo o ultimo desde o inicio. Continuarei estudando o gato, sua anatomia e sua fisiologia, e procurando aproximar-me a essa organização psico-física. O percurso continua e certamente, Eugenio Barba não escapará a ele.
“Para entender um gato, devemos levar em conta que ele possui os seus próprios talentos, o seu próprio ponto de vista e até a sua própria moral.” (Lilian Jackson Braun)
Partes das Partes
Neste bimestre, como objetivo da disciplina de Composição Coreográfica I, foram criadas partituras que trabalhassem em cima do que ficou mais forte na pesquisa anterior sobre a coluna. No meu caso, a minha partitura se baseava na figura de um brinquedo infantil, onde este era uma cobra feita de partes, todas elas ligadas formando um seguimento, que para mim, lembrava uma coluna vertebral. Esse formato em ficou tão forte que, continuei minha pesquisa com foco em partes corporais.
Primeiramente trabalhei partes tentando mover cada parte do meu corpo separadamente, ex: Braço, antebraço, mãos, dedos e escapulas de uma forma continua, sem interrupções de um seguimento para o outro. Porém para isso ocorrer no corpo inteiro com qualidade é muito difícil, então escolhi separar meu corpo em 4 partes e trabalha-las separadamente. Assim ficou: cabeça, braços, tronco e pernas.
Experimentei trabalhar partes de cada parte citada, dividi-las em vários pedaços.
Mas ainda faltava um fator que era muito importante, a continuidade do movimento, a passagem de um seguimento para outro sem perder a ligação entre eles, sem ter quebras. Coloquei como regra que para passar de uma parte para outra tinha que ter um estímulo, algum movimento que fizesse essa "outra parte" se mover e a partir daí ocorrer a passagem. Nos meus experimentos, a ordem das partes se alteravam, começava sempre pelos braços mas o depois nunca era igual. A passagem dos braços para as pernas era bem interessante, pois essa movimentação surgia como cadeia ou corrente que dos braços passava, rapidamente como um caminho ou impulso, e chegava até as pernas, que parecia ser o destino.
Após todas essas experimentações, coloquei mais uma problemática, que era enumerar as partes e por intermédio de uma pessoa, que não conhecia a pesquisa, intervir na movimentação, onde ela iria decidir que seguimentos eu iria mover, quantidades de seguimentos e o tempo de troca desses seguimentos. Assim sendo, foi bem diferente com cada pessoas que fiz o experimento, pois cada um tinha um ritmo de troca e vontades diferentes, o que me fazia mover por diferentes caminhos e de diferentes formas essas partes e assim sem querer e ao mesmo tempo querendo se transforamam no todo.
Alana Muniz de Lima
O trabalho que está sendo realizado pela disciplina Composição Coreográfica I pelo curso de Dança da Faculdade de Artes do Paraná se propôs a criação de uma dança que se constrói no processo de experimentação da mesma.
Iniciei minha pesquisa, no primeiro bimestre com a proposta de estudar o estado líquido do corpo. No segundo bimestre, muito diferente do que eu já havia iniciado, escolhi especificar mais em COMO eu atingiria esse estado no momento em que dançasse. Para a mostra desta vez, recortei três procedimentos dos quais experimentei. Esses três procedimentos acontecem como etapas do que seria mostrado. Seguem assim:
1 - Ativação dos líquidos do corpo com a imagem de ir enchendo o corpo com água;
2 - Imaginar o corpo como um recipiente cheio d'água e brincar com o balanço desse líquido com foco nas três caixas: pélvica, torácica e cabeça;
3 - Imaginar uma bolinha d'água que vai escorrendo pelo corpo deixando rastros molhados.
E assim, experimentando essa três estratégias, pude perceber uma mudança no modo de o corpo se organizar, e, por conseguinte, dançar. São estratégias que emergiram da própria experimentação, diferente do primeiro bimestre que eu escolhi os procedimentos antes da experimentação. Entretanto, a pesquisa devem ser mais apurada e aprofundada.
Raquel Messias de Camargo
Imobilidade e movimento artístico
O corpo em movimento, no tempo e no espaço – segundo Merce Cunningham – é uma das definições do que é dança para muitos teóricos e pensadores da arte.
Quando pensamos em dança, sempre se tem em mente um corpo ‘TOTAL’, com cabeça, tronco e membros, todos em plena mobilidade.
Mas pensando assim, a arte dançada apenas se daria por pessoas com total domínio de sua mobilidade motora, utilizando conscientemente seus músculos para produzir dança?
Meu estímulo para desenvolver essa partitura partiu de uma imagem urbana – que muitos curitibanos já conhecem. Um sujeito que faz parte do cotidiano dos transeuntes da rua XV de novembro: O TOCADOR DE FLAUTA SEM PERNAS.
Após algumas observações me pus a experimentar movimentos que não envolvessem os membros inferiores – tarefa esta difícil para quem há anos tem consciência de como se locomover através delas. Após algumas tentativas, percebi que o mote para a pesquisa seria a “intenção” de não mover as pernas e que aquela imagem seria o ‘ponto de relação’ entre a maneira como o meu corpo move o tronco somando a intenção de imobilidade das pernas.
Seguindo o pensamento de cunningham, pensei em basear essa experiência na parte de cima do corpo, utilizando cabeça, tronco e membros para criar uma frase coreográfica – artisticamente instigante, onde os membros inferiores fossem anulados de estímulos para compor a estrutura do trabalho.
Alguns grupos já utilizam de deficientes físicos e pesquisam estratégias de movimentos que atinjam propostas artistas. Nessa pesquisa intencionei propor um trabalho artisticamente rico e expressivo capaz de anular a relação deficiência X dança de forma negativa, mostrando que talvez seja possível colocá-lo em prática com deficientes de verdade.
“A ARTE ESTÁ NA ALMA DE QUEM FAZ, O CORPO APENAS
Por Israel Becker
O QUE É SER DEFICIENTE??
Mas- oh ironia- é grande o número de pessoas que se dizem “normais” e insistem em olhar para eles com uma lamentável e ferina pontinha de incompreensão, vestida de piedade, pena ou preconceito, como a dizer que em si reina o sentido e superioridade.
Como pessoas com limitações físicas, sem qualquer eiva de mágoa gostaria muito de saber onde elas se sentem superiores. Será que decorre apenas do fato de poderem andar mais rápido, de “saírem mais”, de poderem fazer mais coisas sozinhas? Tornará isso alguém superior a outrem?
Não posso e nem quero aceitar que essas pessoas sintam-se superiores, pois só delas pensar dessa forma já é um grande defeito, capaz de romper o dique dessa vã superioridade. Ás vezes temos pessoas a nossa volta que acham que somos incapazes, e coitadinhos e, mesmo sem assim pretenderem, terminam nos prejudicam. Suas atitudes protecionistas, ainda que movidas por amor, findam por nos atrapalham o desenvolvimento já que nos privam de coisa que inevitavelmente teríamos possibilidade e condições de realizar, realizando-nos.
Se essas pessoas nos privarem da vida, isolando-nos da atitudes de preconceito, do mundo em geral, como irá ser quando precisarmos enfrentar o mundo real, as pessoas como são, a vida em suas várias facetas?
Existem também pessoas que simplesmente não acreditam em nós, achando que nunca ninguém irá gostar de nós de verdade. Acham que todas pessoas que se aproximam de nós ou querem aproveitar de nós ou trazem maldades no coração. E todo nós sabemos que não é assim. Existem pessoas que gostam de verdade da gente, pessoas que não ficam olhando nossos “defeitos” de soslaio ou com falsas piedade, são pessoas que quando conversam conosco, vendo-nos nos olhos, dizendo, por gestos e palavras, que estão ali por prazer, não só para nos agradar... Mas, infelizmente, são poucas essas pessoas. Por isso que elas são tão valiosas e valem muito.
Minha grande dificuldade é lidar com a necessidade de algumas pessoas que vivem buscando o perfeito físico, anatômico, da aparência apenas, deixando no esquecimento ou no arrebol dos escaninhos da alma a essência verdadeira das criaturas, inclusive si mesmo. Toda a perfeição a ser buscada deve ser a do coração, pois quanto ao resto a gente vai superando com o tempo. O importante não é o corpo, e sim a alma!!!
E antes de ter este corpo que eu amo, eu sou a alma que o habita. Será isso visível um dia?"
Eliza Desidério César Bento
Identifiquei uma parte de minha pesquisa nesse texto de Eliza Desidério que se questionava sobre o que é realmente ser deficiente, seja qual for o tipo de deficiência. Minha pesquisa é também uma critica e se faz em cima de como realmente se sente um portador de deficiência diante dessa sociedade que tanto julga por aparências externas,vaidade, beleza e corpos perfeitos.
Minha pesquisa pode ser muito ampla e tomar vários caminhos, através dela posso seguir e levantar inúmeras questões, mas antes de tomar o caminho final quero conviver com essas pessoas e aprender a perceber o meu corpo da mesma forma que elas percebem seus próprios corpos, a forma como se colocam e se enxergam diante do mundo, o que representa a vaidade para elas, a forma como se portam e levam suas vidas tentando chegar o mais perto possível do "normal". Quero mergulhar num mundo novo e desconhecido através de quem realmente vive nele e assim poder ampliar meus conhecimentos não só corporais, mas sim humanitários e passar a entender essas pessoas a fundo, repeita-lás como merecem e de alguma forma colaborar para a inclusão definitiva delas numa sociedade preconceituosa, "cega e muda" diante dos fatos.
* JULIANA GOMES DIAS *
EXPANSÃO CORPORAL
A expansão corporal que trato neste trabalho vem da relação com o corpo no espaço, onde seus movimentos se ampliam com um fluxo de energia maior, este fluxo corresponde muito a respiração. A respiração está como suporte para que a expansão ocorra, os exercícios de Bartenieff baseiam-se na respiração abdominal, ou seja, inspirando-se profundamente até a região do abdômen. A grande maioria dos movimentos acorre na expiração para conectar várias partes do corpo.
Esta respiração trás a dilatação do corpo, como se o enchesse para expandir através de movimentos pelo espaço. Através de experimentações pude focar a respiração como mote inicial de preenchimento para a execução dos movimentos. Segundo Ciane Fernandes, a respiração consiste em um “enchimento” e “esvaziamento” corporais, trazendo vida a todo corpo.
Para a apresentação deste trabalho usei as experimentações realizadas em sala de aula, com a utilização de música para pesquisar e nortear o trabalho, assim destes experimentos, o quadril surgiu como um foco para iniciar a minha movimentação, e dele expandir para o corpo. Os fatores de Rudolf Von Laban, peso, fluxo, tempo e espaço, trouxeram base para ampliar a minha pesquisa e aprofundar na questão de expandir o corpo, com estes fatores pude desenvolver especificamente direções e colocá-las em práticas.
Foi a partir destes experimentos que desenvolvi a partitura, com base na respiração, energia e espaço. Percebo que o meu olhar esta muito presente neste processo, o foco para o espaço externo e o foco para o espaço interno, onde preciso desenvolver e especificar algumas indagações presentes neste ponto.
Carina Maragno Trombim
Referências:
-FERNADES, Ciane. O corpo em movimento: o sistema Laban/ Bartenieff na formação e pesquisa em artes cênicas. 2 edição – São Paulo: Annablume, 2006.
-Imagem: Richard Heeks/ Barcroft Media http://akapink.blogspot.com/2009/07/bola-de-sabao.html, acesso em 05/07/2010.
BIOGRAFIA
Este trabalho é uma proposta da disciplina lecionada pela professora Rose Rocha que começou com uma pesquisa sobre a coluna vertebral, e depois aprofundar uma questão ou um tema que havia no trabalho. Na primeira apresentação o trabalho “COLUNA: UMA SÍNTESE DAS PARTES” tinha o objetivo de pesquisar as funções da coluna tais como: suporte, transferência de peso, amortecimento e o vai e vem das informações relacionando com as sinapses e como o tempo dessas informações são influenciados por algo do meio.
GÊNESE
Aos eventuais leitores, atualizo que tal trabalho se trata da continuidade da proposição “Pegadas de uma Coluna Vertebral” (1) apresentada na mesma disciplina ao término do primeiro bimestre deste ano.
O processo nesse segundo momento teve como ponto de partida o questionamento sugerido pela própria professora: qual o assunto que tratávamos nessa composição coreográfica? A resposta só veio à tona algumas semanas depois, a partir da discussão do trabalho de outra acadêmica. Meu assunto era EU mesma! De onde vim? Quem sou? Qual meu papel no mundo? Para onde irão (...e se virão) meus descendentes? Simplesmente elementar e complexo.
Por quantos heróis desconhecidos viajei?
Por quantas terras pisei?
Por quantos olhos os meus pousei?
Por quantos lábios minha língua aqueci?
Por quantas lágrimas escorri?
...Ah por quantas rajadas de vento meus cabelos foram badernados?
Por quantas danças me entreguei?
Por quantas horas pari?
Por quantas noites quis morrer?
Por quantos dias morri?
Por quantos sóis quis viver?
Por quantos entardeceres (re) nasci?
E por mais quantas chuvas, com ignorância e sapiência me perguntarei: Por onde terá passado o sangue que me corre?
eu.
eu atrás. eu ao lado. eu à frente...
eu sempre NÓS, e sempre tentando ser eu.
NÓS... Tão claro quanto a claridade da lua e das estrelas balseando sobre o rio, e eu, na minha estúpida grande pequenez, insistindo em ser eu, enquanto sou tudo e simplesmente NÓS. (2)
Em seguida, paralelo aos nossos laboratórios particulares nos foi sugerido que procurássemos um vídeo de dança que tivesse em convergência ou que de alguma forma se aproximasse com a nossa pesquisa. Depois de algumas buscas virtuais e vasculhadas nas minhas memórias, lembrei-me do trabalho do artista Ney Morais da Cia Municipal de Dança de Caxias do Sul, intitulado “Linha Aberta” (3), que definitivamente reforçou e nutriu a continuidade da composição, por tratar através da dança contemporânea a dimensão interior do indivíduo em confronto consigo mesmo e com o outro.
O passo seguinte foi a busca por uma música que dialogasse com o assunto central da partitura pesquisada. Para esse momento estabeleci relações com as matrizes musicais brasileiras, dos povos originários de Pindorama. A música selecionada “Mito – Metumji Iarén” de Marlui Miranda do disco “Marlui Miranda – Ihu Todos os Sons” foi levada ao estúdio para que não só os meus laboratórios fossem estimulados por ela, como também as experimentações dos outros da turma. Nesta fase da pesquisa ficou evidente o foco da movimentação no tronco com a base nos pés enraizados.
Finalmente, a última ferramenta utilizada para clarear a partitura foi a imagem da dupla espiral do DNA. Na intenção de focalizar para aquilo que era mais micro, mais particular, mais radical na minha constituição enquanto ser vivo me aproximei da idéia da dupla espiral do DNA, por ser a estrutura que contêm as instruções genéticas que coordenam o desenvolvimento e funcionamento de todos os seres vivos e alguns vírus.
O resultado desse processo foi uma partitura de movimentos calcada sobre a base fixa dos pés, e a crescente movimentação espiral/circular de mãos, braços, cabeça, tronco, quadril e joelhos, novamente movimentos de um corpo/indivíduo/história.
SYLVIANE GUILHERME
“DE QUANTO DE TERRA UM HOMEM PRECISA?”
Neste bimestre tivemos que criar uma partitura corporal, ou um trecho coreográfico, partindo de alguns pontos escolhidos da pesquisa anterior e especificando estratégias de criação.
O único ponto escolhido do trabalho passado foi optar por uma das principais características da dança clássica japonesa Kabuki, ou seja, dar a ênfase na movimentação das mãos. E as outras estratégias que especifiquei foram: 1) selecionei um conto (“De quanto de terra um homem precisa?”) de Leon Tolstoi, onde o personagem principal desta obra (Pahón) será interpretado na minha pesquisa, e também para servir como primeiro um estímulo para a minha criação de movimento; 2) como um auxilio a minha pesquisa assisti a alguns vídeos de dança de coreógrafos como a Pina Bauch (“Sagração da primavera”) e Philippe Decouflé (“Le Petit bal perdu” e “Abracadabra”); 3) nas improvisações/investigações que realizei me baseei nos conceitos do Teatro Físico na construção do personagem; e 4) a partir da improvisação, ou seja, do levantamento de material fiz uma seleção desse material, e depois realizai uma ordenação (composição de uma partitura) do mesmo (HÉCOLES, 2004).
Teatro Físico
É difícil defini-lo, pois não é um termo claro, onde ao mesmo tempo, pode ser alvo de muitas diferentes interpretações.
Mas a explicação mais comum é de um trabalho que o corpo/ fisicalidade e os movimentos do artista são predominantes em cena, ou seja, onde a visualização dos gestos/ movimentação é um elemento primordial:
O Teatro Físico quer enfatizar a materialidade do evento; physical poderia ser traduzido como “conectado ou relativo ao corpo”, correspondendo àquilo que pode ser sentido ou visto e que não existe numa dimensão espiritual ou mental. [...] uma ação sobre a fisicalidade, gerando uma certa disposição do corpo, em função de uma teatralidade específica (ROMANO, 2005, p.16).
No entanto, ele não se limita apenas isso. Segundo a Eliane Rodrigues Silva e Rosimeri Rocha:
[...] no Teatro Físico constrói-se numa experimentação de longo prazo extremamente laboriosa, reunindo séries de informações que se entrecruzam a partir de lembranças, observações, exercícios dramáticos, exercícios físicos, leituras e tudo aquilo que pode agregar-se na elaboração do personagem e da cena (Rocha; Silva, 2009, p. 39)
Ou seja, me ‘utilizarei do Teatro Físico’ da seguinte maneira: vou estar focada não apenas na construção de uma partitura de movimento, mas também na construção do personagem Pahón (existente no conto de Leon Tolstoi), como foi citado acima, me utilizando de todos os recursos possíveis (lembranças, observações, exercícios físicos, leituras. etc.) para essa consecução.
*Foto: "Moldura natural...", autor: José Branco. http://br.olhares.com/moldura_natural_foto3663987.html
HADIJI Y. NAGAO
domingo, 4 de julho de 2010
Infinita na imobilidade total.
Através de rastros deixados pela pesquisa anterior focada na coluna vertebral, emergiram questões relacionadas à busca pelo corpo comunicante, a comunicação humana, a troca de informações. Envolvidos neste processo de comunicação, existem maneiras infindas que permitem interagir e efetuar trocas informacionais, pois o estudo da comunicação é amplo e sua aplicação é ainda maior. Comecei a pensar em novos processos de comunicação, que englobasse a comunicação em massa, e a comunicação pessoal.
Desta forma, busquei a fotografia como mote desta pesquisa de corpo, comunicação e dança. A idéia determinante neste estudo é relacionar a fotografia com a dança, o que têm em comum dentro dessas duas áreas resultantes em um processo de comunicação, nos quais utiliza sistemas simbólicos como suporte para este fim.
Logo de início, surgiram várias indagações, pois trata-se de um tema que pode seguir diversos caminhos, os quais ainda não foram delimitados. A imagem, assim como a dança, por ser uma linguagem específica, torna-se mais flexível de compreensão, por suportar em sua estrutura vários significados. Esta relação da imagem com a dança, é permeada de sentidos que falam à vivência do espectador, reelaborando e permitindo o surgimento de experiências. Seu caráter polissêmico permite diversas e infinitas leituras.
De acordo com o artigo: “Para salvar do esquecimento: da fotografia ao teatro da morte de Tadeusz Kantor”, de Thais Helena D’Abronzo e Maria Irene Pellegrino de Oliveira Souza, a fotografia é o rompimento com a realidade cotidiana, pelo aprisionamento do tempo, contrapondo-se ao cotidiano contínuo. O disparo da câmera é o corte definitivo do tempo-espaço com a realidade cotidiana; é a quebra da continuidade do cotidiano.
Há uma frase de Dubois que diz: “O olho jamais vê aquilo que está fotografando. Ou ainda: fotografar é não ver”. A meu ver, na dança, esta analogia permite pensar na incerteza daquilo que será comunicado, por mais que esteja estruturada uma determinada partitura coreográfica, o criador só saberá realmente o significado, ou ainda, o que comunica, após apresentá-la.
Durante a criação de uma coreografia, por exemplo, a fotografia pode servir como mote. Dubois define a fotografia como “infinita na imobilidade total, congelada na interminável duração das estátuas”. A imobilidade da imagem fotográfica atesta em seu estado de tempo um movimento simbólico, porque acredita que a realidade da morte é a pausa da vida cotidiana e a perpetuação desse corte é o seu movimento dinâmico. Este dinamicismo da imagem estática se permite através da imaginação, como traduz a própria palavra, dar vida à imagem.
Para a apresentação prática deste bimestre, a estratégia foi separar palavras-chave que traduzissem a pesquisa realizada até o momento, deixando pouco evidente a questão da fotografia em cena. As relações estabelecidas por mim, entre teoria e prática, nesta pesquisa, por enquanto, exprimem-se em experenciar os elementos presentes na fotografia.
Amábile Gabriele Bortolanza
(Fotografia: Alceu Bortolanza)
Falo sobre círculo, no qual não há fim, nem começo, apenas somos o próprio, ou estamos dentro dele.
A partir dai desenvolveu-se a pesquisa que veio da coluna na visão de anéis, que compõem um todo, então me deparei com algo maior que somente anéis: veio a mim a ideia de circulo em nosso corpo, rondando e arrondando a perspectiva de movimento.
O círculo historicamente desde seus primórdios representa, religiosamente danças e rituais, sendo formado pelos seus integrantes uma espécie de elo, de onde a energia que se evocava se acumulava em seu interior, e também não deixava nenhum outro tipo de energia interferir ali.
Portanto em minha partitura o circulo foi passando pelas variações de seus significados, sendo que, por ele tentei expressar partes da minha vida.
Quando se têm um objetivo, você parte de um certo ponto, e o final dessa trajetória irá sempre voltar no seu ponto inicial, que era seu objetivo, são círculos que damos e fechamos em nossa vida. Não se pode ignorar o fato de que quando pretendemos algo, nos fechamos para tal, tudo se segue em prol daquilo que se almeja, você pode estar no caminho ou olhando de fora, mas sempre será você, e somente você a única pessoa que poderá fechar esse circulo e formar outros.
TRANSEUNTE
Movimento Acústico
A partir dos estudos de Alexander e Feldenkrais, Marcia Strazzacappa, em um de seus artigos, conclui que: “A cabeça é tida como o centro de orientação, pois ela comporta os pares receptores, como os olhos, as orelhas e o nariz (com suas duas narinas). Nós percebemos o mundo de forma simétrica por meio de nossos receptores; assim nossa cabeça gira automaticamente na direção da fonte de estímulo para olhar, ouvir ou cherar de forma equilibrada. O resto do corpo segue automaticamente esse movimento da cabeça; logo, a cabeça é o centro de orientação”. Partindo deste conceito, toda a minha pesquisa de movimento sera baseada nos sensores humanos e na percepção dos estímulos físicos do ambiente.
Estímulo físico é qualquer alteração externa ou interna que provoca uma resposta fisiológica ou comportamental num organismo. Estímulo, por exemplo, são as variações de pressão do ar movimentando o tímpano, a luz sensibilizando a retina, as moléculas no ar estimulando o olfato, etc. Do ponto de vista físico, estímulo pode ser mensurável, e substâncialmente excita os aparelhos sensoriais da mesma forma em todos os indivíduos. Por exemplo, um som de 3 kHz produz 3 mil oscilações em um segundo, este som estimula os tímpanos de todos os indivíduos a sua volta vibrando-os 3 mil vezes por segundo. É fato.
Diferentemente, a percepção é a função cerebral que atribui significado a estímulos sensoriais, a partir de histórico de vivências passadas. Através da percepção um indivíduo organiza e interpreta as suas impressões sensoriais para atribuir significado ao seu meio. Consiste na aquisição, interpretação, seleção e organização das informações obtidas pelos sentidos.Nossa percepção esta intimamente atrelada aos limiares do sensor. O limiar de sensibilidade é a quantidade mínima de estímulo necessária para que um sensor o perceba. O limiar de saturação, por sua vez, é a quantidade máxima de estímulo que o órgão sensorial suporta, muitas vezes atrelada a dor ou perda permanente do órgão sensorial. Já o limiar de diferenciação é a quantidade de estímulo necessária para que o organismo receptor perceba um crescimento ou um decrescimento progressivo da excitação. Por exemplo, a quantidade de som necessária para que o indivíduo perceba nitidamente que ouve um aumento ou diminuição do mesmo.
Outro fato físico importante para minha pesquisa é o efeito de precedência ou efeito hass, relacionada a audição. É através deste fenômeno que percebemos espacialmente o som, ou seja, “de onde o som vem”. O efeito hass é o fenômeno psicoacústico que permite identificar corretamente a origem de um som percebido por ambos ouvidos, mas que os alcançam em momentos diferentes. Se o ouvido direito percebe primeiro, o som vem do lado direito.
Minha intensão nesta pesquisa é evidenciar e estimular o órgão sensorial auditivo, percebendo os estímulos sonoros naturais do ambiente (sem música) e partindo dele todo o movimento da cabeça e consequentemente do corpo. Por serem sons naturais, são 100 % aleatórios, tornando o experimento coreográfico também essencialmente randômico. Para previlegiar a audição, a estratégia adotada foi tentar minimizar ao maximo os outros sensores, fechando os olhos e “descartando” o tato, o olfato e o paladar. Ao anular alguns sentidos é fácil entender que alguns fatores fisiológicos, antes totalmente dominados, se perdem, tais como o equilibrio e a percepção espacial.
Levando-se em conta todos estes fatore, a movimentação esta intimamemte ligada com a sonoridade do ambiente e a sua percepção. Exemplificando, se há som forte, o movimento é forte, se há som fraco, o movimento é suave, se há som continuo, o movimento é ligado, se há som curto, o movimente é stacatto, de acordo com o envelope do som. O movimento começa a se deliniar a partir do limiar de sensibilidade, ou seja, é necessário que o som seja suficientemente percebido para que haja movimento. Também, levando-se em conta o limiar de diferenciação, o movimento se desenvolve (se altera) a partir da mudaça de intensidade do som. Caso haja sons com intensidades proximas ao limiar de saturação no ambiente, a movimentação sera de repúdio, afastamento, uma vez que estímulos próximos ao limiar de saturação são extremamente agressivos ao sensor, podendo inclusive causar surdez permanente. Além da qualidade de movimento, o som ainda orienta a disposição cênica da experimentação, ou seja, se há sons na esquerda, toda a movimentação seguirá para a esquerda, partindo da cabeça, mencionada anteriormente como sendo o centro de orientação.
Resumidamente, a estética do experimento se concentra na tradução quase que literal dos estímulos sonoros em um determinado ambiente, na tentaviva de anular os outros estímulos.
FRANCIELE PASTURCZAK