quinta-feira, 30 de junho de 2011

Na minha proposição aos meus colegas que foi relacionada com minha pesquisa , procurei estabelecer um conceito de dança , um pensamento construído a partir das relações entre técnica, cultura e hibridismo. Técnica no sentido de aprendizado (modos de fazer alguma coisa), cultura na maneira de como eu aprendo e como as informações chegam até mim, dependendo dos valores de cada um, que estão ligados a escolhas, gosto e preferências, e por fim o hibridismo que vai entrar no momento em que estas relações se misturam, pra se transformar em uma outra coisa que será fruto de todas as experiências vividas por cada corpo, isso tudo vai gerar um pensamento estético que traduz a dança de cada indivíduo, uma dança autobiográfica , dança esta que será corporificada.
Eraldo

Olhando para o que a autora Jussara Sobreira Setenta escreve em seu livro: “O Fazer-Dizer do Corpo Dança e Performatividade” (2008), pensar o corpo que dança na performatividade e que se enuncia em corposmídias, corpos implicados e comprometidos com as relações que estabelecem com o ambiente. Além disso, constróem condições de contaminação do pensamento para produção de danças que organizam e enunciam suas idéias de diferentes modos. Em alguns desses modos, os processos tendem a abordagens interrogativas e investigativa pertinente ao fazer dança. Importa instigar o exercício de ações-atitudes performativas, trabalhadas em corpos que são mídias de si mesmos e, que, abordam e discutam questões da diferença no fazer-dizer artístico. A mídia de que o corpomídia fala é um processo co-evolutivo e transformador, e não somente difusor e transmissor de informação, a mídia do corpomídia se refere ao seu modo de estar no mundo. A perquisa tem como objetivo de comunicar si mesmo, de mostrar ao seu público seu posicionamento no mundo e suas inquietações e questionamentos.

O corpo é, portanto, movimento em permanente comunicação. Entende-se que o corpo que entra em cena está sempre disponível, não significa despir o corpo das informações existentes, elas não podem ser descartadas. É interessante que ocorra o aproveitamento das informações estrangeiras e conhecidas, no exercício do fazer, no processo de produção da fala, e a reflexão crítica, mais uma vez pode colaborar para a percepção de como aproveitar as informações. No fazer da dança performativa se inventa um modo de dizer próprio, urdido no fazer. Um fazer que tem um tempo de feitura vinculado ao próprio fazer. Então para produzir esse dizer só seu, o corpo trabalha experimentando/testando as informações, movimentando-se, assim vai-se acionando o corpo para a organização da fala.

CARLOS ALBERTO MENDONÇA JUNIOR

Cativeiro ainda não acabou.



Para os navegantes que por aqui baixarem âncora, esta postagem é parte de um processo avaliativo da disciplina Composição Coreográfica II do curso de Dança da Faculdade de Artes do Paraná. Venho por este meio compartilhar um bocado da minha pesquisa. Este bimestre, mais do que referenciais teóricos e afins, fui muito enriquecida por discussões com colegas de classe. Então, eis que emerge o que estava faltando: eu mesma dentro da pesquisa.

Situações de exclusão, de sentir-se à margem - pelas quais eu passei -, mas, ao mesmo tempo, um sentimento bom de coragem. Surge daí a vontade que vai além de entender as manifestações negras da cultura popular brasileira, que é entender a questão social do negro no Brasil.

Por que num país em que a maioria da população é negra, existe um preconceito crucial com os mesmos? Por que a taxa de mortalidade entre crianças negras e pardas no Brasil é dois terços superior à da população branca da mesma idade (IBGE, 1996)? Por que um negro (ainda que bem vestido) é pedido pelos seguranças para se retirar do shopping Estação que fica no centro da cidade - Curitiba? Por que os negros são minoria nas faculdades? Por que quase não há heróis negros reconhecidos? Por quê, por quê?

Qual é essa lógica que exclui que perpetua na sociedade atual? Que, aliás, não se refere apenas aos negros, mas a todos aqueles que são reféns desse sistema que deixa as relações humanas às avessas. A questão é muito mais profunda que cor de pele, entretanto, nesse momento, a minha escolha é essa por fazer parte da minha história de vida.

Na parte prática do trabalho, os experimentos foram surgindo dos questionamentos sobre a margem, sobre a sensação de liberdade corrompida, até que cheguei no procedimento que inclui a parede. Usar o tônus com a ação de empurrar, me trouxe a sensação de tolhimento, tal qual as situações que já passei.

Mil e uma idéias estão borbulhando, mas as pernas só caminharam até aqui por enquanto.


Levanta, nego.
Cativeiro ainda não acabou.


Raquel Messias

terça-feira, 28 de junho de 2011

Sem Respostas...

O trabalho de tcc que estava desenvolvendo, baseava-se no Jazz Dance como mote inicial de pesquisa. Minhas questões com relação a essa dança eram baseadas nos trânsitos de fluxo, onde se varia muito o fluxo contido e o contínuo, e como essa variação se dava no meu corpo. E também dava continuidade a uma pesquisa onde trabalha partes do corpo e suas possibilidades de movimentações, claro que tudo relacionando à dança jazz.
Como disse no começo eu ESTAVA desenvolvendo, não estou mais. Percebi, a essas alturas, que não é isso que quero trabalhar, me peguei perguntando porque e para que estava fazendo essa pesquisa. Não obtive resposta.
Não obter respostas esta muito comum para mim ultimamente, sendo assim resolvi repensar o que estou fazendo com a minha dança, se é que tenho uma. Então, lendo o texto de André Lepecki, Planos de Composição, do Cartografia, Rumos Itaú cultural dança 2009/2010, onde ele detalha o que são esses planos de composição, chão, papel, traço, corpo, movimento, espectro, repetição, diferença, energia, gravidade, gozo e conceito, que se inter-relacionam e como se inter-relacionam para não ser qualquer coisa, para que não viremos um idiota auto movente no meio de um engarrafamento de desejos, não sejamos maquinas executantes apenas. Assim, começo a repensar na minha dança, no meu Eu como artista.
Parto de 3 questões que hoje me fazem refletir:
O que me move a mover ou a não mover?

Quais os movimentos para resgatar o movimento?

Quais os outros modos de explorar criativa e atentamente os espaços cheios do mundo onde uma verdadeira aventura de movimentos no aguarda?


Alana Muniz de Lima

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Inversões - onde por meus pés?


Por esses últimos tempos minha grande pergunta é - o que todos os homens têm em comum, o que em si é inerente que faz com que sejamos diferentes de todos os outros seres vivos? De certa forma é esse o questionamento que vem caminhando e encaminhado para minha pesquisa. Já compreendi que essa não é uma questão tão simples de se achar respostas, que pode ser que essa questão caminhe comigo por muito tempo ou por toda a vida, que então não será possível responder a mim mesma com o trabalho do último ano de faculdade, porém é dessa oportunidade de início de pesquisa que irei começar a trilhar o caminho para aprofundar e quem sabe compreender de vez essa grande incógnita. Com algo tão amplo assim, e ainda mais em meus primeiros passos, fica muito fácil de perder e de encontrar sentido em todas as coisas que vejo. No bimestre que se passou minhas reflexões ficaram a cerca da dança, educação e transformação, tendo deixado claro que venho tentando compreender toda essa questão através da lente materialista histórica dialética. Então, depois de tanto pensar qual seria o próximo passo reconheci que se quero falar de algo que se aproxima de determinado ponto de vista, tenho que primeiramente compreende-lo. Para isso recorri a um texto já utilizado no bimestre passado, em outra disciplina, “Reflexões sobre a história” de Fani Goldfarb Figueira, o qual me ajudou a compreender de fato que quem constrói a sociedade e o mundo é o próprio homem, com sua capacidade de relacionar e interferir no meio que está inserido, assim sendo produtor de necessidades a todo o momento. Nesse texto também compreendi que quando nos conformamos com determinada realidade ou quando dizemos/achamos que esta é a correta estamos matando toda nossa história, pois somos movidos pelas transformações, que ocorreram e que continuamos a mover, e se há um correto ou imutável nenhuma transformação a mais deverá acontecer, essa afirmativa me trás alimento para acreditar que o mundo, do modo como hoje está posto, não foi sempre assim e muito menos precisa continuar sendo. Para reforçar e compreender ainda mais o olhar através dessa lente recorri ao livro “O que é Marxismo” de José Paulo Netto, da coleção Primeiros passos, porém esse li apenas as vinte primeiras páginas, devido à sobrecarga de outros afazeres. E nesse exato ponto, relato minhas experiências práticas a cerca da pesquisa.

De pernas pro ar e sem meus pés no chão experimento todo o peso de estar inserida numa sociedade que está, segundo Eduardo Galeano, “... com a esquerda na direita, o umbigo nas costas e a cabeça nos pés.”.

Com quem você está e para quê? Foi o mote, sem saber, para essa nova prática que esta se dando em meu corpo. Os pés para cima, onde irei colocá-los e porque aqui e não ali ou quem sabe acolá? Com quem estou ou com quem quero estar? Por quê? Para quê? Preciso por meus pés em algum lugar! E como é difícil assumir um posicionamento. Fácil é deixar-se levar pela massa ou pela maioria, quando não, ficar exatamente em cima do muro para quando for conveniente pular para lá ou para cá, assim sem compromisso. Preciso por meus pés em algum lugar e enquanto isso não acontece reconheço toda a inversão do mundo, uma vontade de ir para algum lugar, talvez até caminhar com as mãos, mas como se não tenho forças, ou quem sabe tocar os pés no teto, também não é possível, reconheço e assumo que não posso querer a continuar enxergando o mundo com seus valores invertidos ou então me inverter para poder vê-lo de forma correta, tenho é de por meus pés no chão e a partir daí... não sei o que vai dar.


Mariana Alves

O MUNDO EM MIM


CONTEXTUALIZANDO: Esse é um relato sobre o processo de criação do trabalho artístico de finalização da matéria composição coreográfica 2, do curso de Bacharelado em Dança da Faculdade de Artes do Paraná, ministrada pelo Professor Giancarlo Martins.

Meu trabalho foi iniciado a partir da idéia de sombra da psicologia Jungiana, a forma que encontrei para dar “forma” a essa idéia era trabalhar a sombra do corpo literalmente, minha dança aconteceria na sombra única imagem a ser vista pelos espectadores. Continuo desenvolvendo essa idéia, mas agora muitos outros elementos começaram a permear esse trabalho, segue então o relato:


RELATO DAS ATIVIDADES NO 2º BIMESTRE

Neste segundo semestre muita coisa aconteceu na minha vida, muitas percepções se apoderaram de mim de forma que seria impossível meu trabalho não ser afetada por elas.

Quando escolhi trabalhar com a sombra, queria falar sobre essa coisa escondida dentro de nós, que não foi domesticada, que olha para o mundo e vê muita coisa errada com ele, mais do que falar de defeitos humanos (que é o ‘censo comum’ de sombra) eu queria falar do que nos faz humanos, o que nos faz olhar para algumas cenas e encher os olhos d’água, o que nos faz corar de vergonha, o que nos faz cegar de raiva, etc. Então, estudando Jung essa minha idéia foi confirmada:


“Muitas pessoas, em nossa sociedade civilizada, perderam sua sombra, livraram-se dela, tornando-se apenas bidimensionais: perderam a terceira dimensão e com ela o próprio corpo. O corpo é amigo, mas duvidoso, por produzir coisas de que não gostamos; há inúmeros fatos a ele relativos que não podem mesmo ser mencionados. Por isso, ele freqüentemente se presta á personalidade do lado sombrio do ego. Às vezes, representa “o esqueleto escondido no armário”, e todo mundo naturalmente quer ver-se livre disso.” (JUNG)


Li isso ao mesmo tempo em que estava lendo sobre cultura e história das civilizações, comecei a estudar isso porque ano passado fui muito instigada por uma amiga a pensar sobre: Como eu fazia arte contemporânea/pós-moderna sem estudar o que é pós-modernidade? Sem saber o que estou veiculando através dessa linha de pensamento e sem saber ainda, se eu gostaria de me vincular e propagar através da minha arte o discurso pós-moderno! Então comecei a buscar informações, ela me indicou algumas leituras e ao mesmo tempo eu fui buscando outras, até a chegar a questões de raiz histórico culturais. Sendo assim, comecei a me dar conta de que a ‘perda da sombra’ é fundamentalmente fruto da nossa organização social, e que isso implica na nossa perda de identidade e desumanização.

Mas investigando outros autores, observando e vivendo, percebi que a sensibilidade a essas idéias não me acometeu assim do nada, sou filha de um operário do ABC paulista, nordestino, que veio para São Paulo tentar um jeito melhor de sobreviver, que trabalhou cortando cana desde os 7 de idade e aos 15 já era o chefe da família. Neta de uma mulher negra que saiu da roça, mais precisamente de Iguape região quilombola de São Paulo, para tentar a vida em São Paulo. Aprendi a ler antes de ir para a escola nos livros e jornaizinhos do Sindicato dos Químicos do ABC (Sindiquim) do meu pai e do meu avô, não tinhamos televisão por questões religiosas, mas tínhamos muitos livros em casa para ‘não ficarmos ignorantes’, como protestavam os parentes do meu pai pelo fato de não termos o bendito aparelho. Enfim, em resumo minha visão de mundo foi moldada por essa trajetória de família, de vida, de origem, e no meu processo criativo está cada vez mais claro que o crio, com o que me identifico, com o que me importo, o que quero mostrar do meu trabalho é reflexo dessa história de vida minha e dos meus familiares.

Sendo assim, por experiência de vida, histórico genético impresso em mim, sinto e sei o quanto essa lógica que vivemos é perversa e o quanto nesse momento ela chega num ápice de desumanização absurdo, agora tomo contato com as teorias que defendem essas idéias que me rondam desde criança e que me esclarecem o motivo pelo qual meu pai, minha mãe e meus avós (maternos e paternos) tiveram uma vida tão árdua, e que o que eles viveram está também inscrito em mim, e que apesar de nossa situação econômica ter melhorado absurdamente, o mundo continua ainda pior e outras pessoas passam a fome que meu pai e meus avós passaram.

Contei toda essa história porque nesse bimestre foi o que ficou de mais importante para mim, o trabalho que criei até agora expressa essa história da minha árvore genealógica, mas não é só o meu umbigo, é o que existe no meu umbigo e que tanto dói no umbigo do mundo, é o que há de global na minha experiência como ser humano, pois quem não passou ou ouviu nada disso, pode ver nas ruas da cidade e em todos os cantos da nossa sociedade.

Enfim, a reflexão vai além e não posso me demorar em escrevê-la aqui porque preciso fazer os demais trabalhos que a lógica de produção demanda, mas faço minhas as palavras de Saramago, é por esse caminho que vai o meu raciocínio...




REFERÊNCIAS:

JUNG, C. G. Primeira Conferência - Fundamentos da psicologia analítica. Petrópolis, Vozes, 2001, Vol. XVIII/1



domingo, 26 de junho de 2011


“Produção artística é um ensaiar”

Grande parte da produção artística hoje é um tipo de pesquisa. Em dança, pode-se dizer que coreografar virou quase um sinônimo de pesquisa coreográfica, e artistas da dança tem preferido um meio de pesquisa e não uma colagem de passos puramente estética e sem reflexão.

O curso de graduação em dança da Faculdade de Artes do Paraná (FAP) faz com que os alunos ao longo de quatro anos reflitam sobre arte, aprendam conteúdos no corpo por fim façam como trabalho final uma composição coreográfica que demande pesquisa teórico-prática. Apresentação do resultado será “o processo vivo pelo qual a obra se torna tal como aparece, e para revelar, portanto, as razões dinâmicas do seu aparecimento.”(ECO, 1972, p 21)

O tema escolhido começa a ficar menos nebuloso assim que foi possível entender o que era importante para este trabalho artístico. Tentar definir arte seria restringi-la, uma vez que é justamente a sua pluralidade que se faz permanecer no, e formar o, mundo.

A arte transcende e recria a realidade, por isso, definir e conceituar especificidades não carece. Assumindo o ponto de vista de Jacques Derrida de que não existe nada fora do texto, já que o texto é a eterna negociação entre interlocutores, a dança, a literatura e a pintura por ser também uma modalidade de comunicação do homem, são consideradas um tipo textual. Estas não possuem uma definição fechada, uma vez que há uma infinidade de variantes. Cada obra tem sua especificidade, se dão neste espaço comunicativo em diferentes instâncias do performático, seja ele oral, escrito ou corpóreo.

O que é pretendido neste trabalho é fazer algo que abarque duas das diversas manifestações chamadas Literatura e Dança ao mesmo tempo.

Umberto Eco diz que “As obras literárias convidam à liberdade de interpretação porque propõem um discurso com muitos planos de leitura, defrontando-nos com a ambigüidade da linguagem e da vida.”

A obra literária escolhida foi o conto de Hans Andersen “A pequena Sereia”. Dizem que das estórias que ele criou, foi a sua favorita porque instaurou sua visão pessoal e emocional de mundo em uma estória. Foi a que realmente tocou Andersen durante seu processo de criação, provavelmente porque de muitas formas se relaciona com esta.

Ele viu uma parte de si na figura da pequena sereia, uma vez que morava numa aldeia pequena e tinha um sonho de pertencer a outro mundo, o mundo do teatro e por isso seguiu em frente, aos quatorze anos, para procurar uma fama com a carreira com o teatro. O conto pode ser considerado uma grande metáfora do que o escritor carregou em sua vida: dificuldades, solidão, dor. No conto, a sereia para conseguir uma alma imortal teria que fazer um homem se apaixonar por ela. Para fazer isso ela se sujeita a um sacrifício (perder a voz). Andersen mostra a dor que ela sentia por ter pernas, abandonar sua vida em um mundo e se sentir de certa forma, também, sem pertencer a ao mundo dos humanos. Ao mesmo tempo em que conseguiu estudar e ser aceito em Copenhagen, era como se ele não se encaixasse naquela sociedade, Ele fora pobre e trabalhava muito, não permitindo que se sentisse um membro da elite social. Por mais que tivesse prestígio como escritor (que lhe garantiu imortalidade), nunca tivera sorte no amor e era muito solitário. Talvez isto foi metaforizado na morte da sereia tornando-a espuma do mar, mas, por causa do amor que sentiu, sobreviveu para sempre como alma imortal.

Não é traduzir esta obra literária para a linguagem da dança. É esta obra cheia de metáforas e ao mesmo tempo tão autobiográfica e esta ambigüidade me faz com defronte a minha vida e a linguagem que quero utilizar.

Escolher um tema para estudar e coreografar deve ser algo de dentro, algo que perturba e de alguma forma e precisa sair. O trabalho de um artista não é uma inspiração, é o trabalho sobre algo até ele tomar uma forma. Para Eco (1972) a produção artística é um “ensaiar, um proceder através de poropostas e esboços e interrogações pacientes da matéria...” e “dispõe, portando, de um critério, indefinível, mas muito sólido: o pressentimento do resultado... o advinhar da forma”(p.18).


Inês Saber, graduanda do Curso de dança da FAP

REFERÊNCIAS:

ANDERSEN, Hans. ”Fairy Tales”. London, Pinguin, 1994

ECO, Umberto . “A Definição da Arte”, Lisboa, Edições 70, 1995.

ECO, Umberto . “A literatura contra o efêmero”. Folha de são Paulo caderno “mais” de 18/2/2001

sábado, 25 de junho de 2011

Um breve pensamento sobre fotografia e movimento


A partir do momento que o ato de fotografar se tornou real, adquirir um registro visual à curto prazo passou a fazer parte do cotidiano, e muitas mudanças, não apenas tecnológicas, ocorreram: o comportamento das pessoas, a rapidez com que novas câmeras surgiam, a economia muda com a chegada dessa nova maneira de se produzir e reproduzir imagens. A fotografia traz um surpreendente colorido para as próximas gerações, no século XIX o mundo era acinzentado: jornais, muros, dinheiro. Hoje as cores gritam em diferentes tonalidades, nos tornando muitas vezes “surdos oticamente”. As cores ganham outros significados e o preto e branco se tornam magia de um pensamento conceitual. “O universo fotográfico nos habitua ao progresso.” (FLUSSER, pág34).
Mas muito mais que uma simples forma de registro, a fotografia se torna arte. Arte de transmitir o indizível e o invisível a olhos nus, de transmitir informações e de multiplicar idéias. O fotografo tem que esgotar todas as possibilidades, descobrir as potencialidades de cada cena, muitas vezes ignorada, é como se fosse um jogo. A cena pode ser considerada o tabuleiro e, as peças o fotografo e o objeto a ser registrado. Cada um tem seu dever e sua importância e se não houver algum deles as jogadas não podem acontecer. Cria-se uma relação entre essas três partes: o fotografo, o objeto e o aparelho.

“Ao fotografar, o fotografo salta de região para região por cima de barreiras. Muda de um tipo de espaço e um tempo para outros tipos. As categorias de tempo e espaço são sincronizadas de forma a poderem ser permutadas. O gesto fotográfico é um jogo de permutação com as categorias do aparelho. A fotografia revela os lances desse jogo, lances que são, precisamente, o método fotográfico para driblar as condições da cultura.” (FLUSSER, pág. 18)

O ato de fotografar articula conceitos, o aparelho faz com que o fotografo transcodifique suas intenções muito antes de transcodificar em imagens. “Em fotografia, não pode haver ingenuidade.” (FLUSSER, pág. 18). As pessoas não fotografam ingenuamente, elas agem a partir de suas intenções, sejam elas estéticas políticas ou puramente sentimentais, elas passam por essa etapa antes de produzirem imagens.
São praticamente inesgotáveis as possibilidades transcodificadas em imagens, tudo que é fotografavel pode ser registrado. As possibilidades do aparelho são quase infinitas, é a relação da imaginação do fotografo e da imensa imaginação do aparelho. Cabe ao manipulador do aparelho explorar regiões novas a serem fotografadas, explorar o inexplorável, é perceber cenas, conceitos, idéias jamais percebida pelos olhos das pessoas que não participam do ato de fotografar. O fotografo busca incessantemente estabelecer relações com situações até então jamais existentes. Fotografar passa a ser o ato de tornar realidade todos esses conceitos, ele sai do idealismo e passa para o mundo real a partir do momento que surgem as imagens.
O gesto de captar uma imagem parte do momento de decisão: apertar o disparador e aprisionar, para sempre, aquele espaço-tempo selecionado pelos olhos do fotografo. O resultado dessa decisão são imagens, estas que permanecem com duas das quatro dimensões espácio-temporais.

“Devem a sua origem à capacidade de abstração específica que podemos chamar de imaginação. No entanto, a imaginação tem dois aspectos: se de um lado, permite abstrair duas dimensões dos fenômenos, de outro permite reconstruir as duas dimensões abstraídas na imagem. Em outros termos: a imaginação é a capacidade de codificar fenômenos de quatro dimensões em símbolos planos e decodificar as mensagens assim codificadas. Imaginação é a capacidade de fazer e decifrar imagens.” (FLUSSER, pág. 7)

(Fragmento do artigo: DANÇA INTERFACE A FOTOGRAFIA: A MATERIALIDADE DA COMUNICAÇÃO, por Julia Grassato)

Referência:
FLUSSER, Vilém. Filosofia da Caixa Preta, São Paulo, Editora Hucitec 1985





Corpo, Mente, Percepção.

Boa Tarde.

Neste momento, em minha pesquisa – Percepção Sonora do Ambiente – estou focando na percepção do ambiente e suas funções no cérebro. Surgem questões como:

- Quais as informações que o corpo recebe?

- Como selecionar estas informações?

- Como “traduzir” estas informações em movimento afim de organiza-las com uma proposta corporal/cênica/artística ?

Estou realizando experiências práticas e teóricas, com embasamento no livro – Corpo, Mente, Percepção: Movimento em BMC e Dança da Lela Queiróz. Quem ainda não leu este livro, faça esta experiência. Ele é ótimo para todas as pesquisas.

O livro explora as relações do corpo com o ambiente. Com conceitos como o de corpomídia proposta por Helena Katz e Cristine Greiner, o de inconsciente cognitivo de Lakoff e Johnson, entre outros, o livro trata dos campos: BMC e Dança.

“… A mídia à qual o corpomídia se refere diz respeito ao processo evolutivo de selecionar informações que vão constituindo o corpo. A informação se transmite em processo de contaminação.” (Greiner, 2005:131)

“De uma perspectiva biológica, é eminentemente plausível que o raciocínio brotou dos sistemas sensório e motor e que ainda usa esses sistemas ou estruturas desenvolvidas a partir deles.” (Lakoff & Johson, 1999: 43)

Trata também do movimento como o propulsor de todas as redes de informação e interação com o ambiente, contribuindo para a construção de um corpo que comunica e nesse corpo comunicador, o movimento é a condição da comunicação, pois corpo e ambiente estão sempre em constante transformação, uma vez que o fluxo de informações entre ambos não estanca.

Outra questão importante abordada no livro é a percepção que é a função cerebral que atribui significado a estímulos sensoriais a partir do histórico de vivências passadas. Através desta percepção, um indivíduo organiza e interpreta as suas impressões sensoriais para atribuir significado ao seu meio. Consiste na aquisição, interpretação, seleção e organização das informações obtidas pelos sentidos.

Franciele Pasturczak

MAIANITA: Compartilhamento de reflexões de leitura


Aos leitores ocasionais informo que o presente texto diz respeito ao cumprimento do trabalho proposto pelo professor Giancarlo Martins da disciplina de Composição Coreográfica II do curso de Dança da Faculdade de Artes do Paraná do corrente bimestre.

A proposta era de elaborarmos um comentário acerca de uma leitura, palestra, filme, obra artística que tivéssemos tido contato nesse período, e que de alguma forma houvesse suscitado reflexões que poderiam contribuir para o andamento da pesquisa que estamos desenvolvendo.

Minha pesquisa, denominada de MAIANITA, tem claro o ponto de partida: discutir arte/dança na perspectiva marxista, assim como compreender a arte pós-moderna que estamos contemplando e, dessa forma, pensar/criar uma dança que, em oposição à arte fragmentada e esvaziada feita atualmente, tenha como premissa a valorização do homem enquanto ser integral.

Para tanto, trago como mote para esse compartilhamento de reflexões o artigo apresentado no V Encontro Brasileiro de Educação e Marxismo: Marxismo, Educação e Emancipação Humana [1], organizado pela Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis/SC - abril/2011, pelo professor doutor Paulo C. Duarte Paes da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, intitulado “As idéias estéticas de Marx e a arte pós-moderna” [2].

Além da leitura desse material, tive o privilégio de conversar presencialmente com esse artista/pesquisador. Encontrar esse professor e ler seu artigo foi um divisor de águas na minha pesquisa. Muitos dos meus questionamentos estavam contemplados no seu escrito. Encontrar artistas/pesquisadores que estão voltados para o estudo, reflexão e produção, tanto científica quanto artística, sustentada no materialismo histórico dialético, é para mim um deleite.

Em suma, o texto traz como objetivo central compreender a arte pós-moderna, a partir de categorias do pensamento marxista, para elucidar sua relação com interesses econômicos velados no complexo emaranhado de teorias que lhe dão sustentação, através do estudo de autores que tratam o tema numa abordagem crítica e de exemplos da própria arte (PAES, 2011, p. 1).

Inicia seu estudo com uma afirmação elementar a todo teórico que se pressupõe marxista, a compreensão do trabalho como categoria fundante do homem. O trabalho é compreendido nessa perspectiva como todas as ações estabelecidas pelo homem para produzir e reproduzir vida, para dominar a natureza e produzir conforto, ou ainda para criar condições para que as primeiras sejam realizadas. Reitera ainda que, portanto, a origem da arte está no trabalho. A arte é uma forma de reproduzir vida. Os homens produzem objetos com finalidade objetiva, funcional e outros sem utilidade no sentido imediato, porém com formas sensíveis que podem ser sentidas posteriormente por seus observadores. A esse último objeto chamamos de obra de arte.

A forma da obra de arte materializada em um objeto nas artes visuais, por exemplo, pode ser transposta ao movimento quando nos propomos a pensar a dança nessa perspectiva. Existem movimentos corporais produzidos pelo homem que têm uma finalidade funcional e utilitária primeira. O agachar de um agricultor para plantar mandioca tem como objetivo dominar a natureza, cultivar o alimento, produzir vida. Entretanto, quando um homem extrai o aspecto estético desse movimento funcional, e o realiza sem essa finalidade utilitária, carregando-o de formas sensíveis, sentidos e significados, então se produz dança.

Desse modo, o fazer artístico, o fazer da obra de arte, do objeto artístico ergue o sujeito ao desenvolvimento de potencialidades mais elevadas do que qualquer outro objeto produzido por ele. Ao libertar-se da utilidade material dos produtos do trabalho essa dimensão estética eleva-se a um nível superior, tornando-se arte e relação social que cria não apenas o objeto, mas o próprio sujeito (VÁZQUEZ apud PAES, 2011, p. 2).

Abarcar a dança dessa forma nos auxilia a compreender que o homem é histórico. A obra de arte carrega em si essa história ou parte dela. O que se sente e se pensa no presente é fruto da produção histórica de homens e mulheres. A arte não é produto do acaso, do imediatismo, mas sim de tudo que foi produzido anteriormente, e que no fazer artístico é enriquecido pela subjetividade de quem o produz.

Essa historicidade vem sendo apartada das obras de arte. Na dança isso se configura de forma ainda mais intensa. O esvaziamento da compreensão do corpo, portanto, do indivíduo, do ser social como uma resultante não acabada de milhares de anos de relações de homens e mulheres nas empreitadas de produzir e reproduzir vida desemboca na fragmentação de todas as esferas da vida social.

O pensamento pós-moderno, fruto do capitalismo das últimas décadas, se propôs a aniquilar a racionalização histórica das relações sociais, assim como, desqualificar qualquer entendimento da vida humana fundamentada na história, e na compreensão da cultura humana como totalidade.

No artigo, Paes cita um trecho de Marilena Chauí crucial para compreender como os tentáculos da pós-modernidade envolveram as artes. Para a ideologia pós-moderna, a razão, a verdade e a história são mitos totalitários e essa negação da racionalidade, com origens históricas e interesses claros, tem se estabelecido nas artes.

“O pensamento pós-moderno não é apenas indiferente à realidade histórica, mas tem na antihistoricidade sua principal caracterização estética. A realidade mesma não é a matriz ou referência objetiva da obra de arte, mas tão somente uma eclética e irracionalizável multiplicidade de referentes desconectados. A matriz da obra pós-moderna é a própria forma contida na linguagem, como se esta fosse anterior, determinante e totalmente alheia a história (JAMESON apud PAES, 2011, p. 9)”.

É exatamente aqui que podemos aprofundar nossas reflexões acerca da dança. Afinal, a ‘própria forma contida na linguagem’ que vem servindo como matriz para as composições coreográficas não é o corpo e suas possibilidades de movimento? Esse corpo por ele mesmo sem história? Sem história sim, porque não basta falar das experiências particulares desse corpo e argumentar que assim está sendo considerada a historicidade do mesmo. Esse corpo é um corpo oprimido ou opressor? É um corpo que vende força de trabalho, ou expropria força de trabalho alheia? Um corpo que se alimenta de restos industriais nos lixões, ou de frutos e folhas frescas colhidos na hora? Um corpo resignado e desacreditado, ou um corpo inquieto e questionador? Um corpo que foi gerado por caminhoneiro e costureira sobre terra vermelha, ou um corpo criado por latifundiário e empresária no alto de um arranha-céu? Um corpo negro, um corpo índio? Um corpo feminino, um corpo masculino? Um corpo violentado, ou um corpo casto? Cada um desses corpos carrega a história de todo o ser social que o gerou. Falar dele isoladamente desconsiderando cenicamente suas determinantes concretas é mesmo que descartar a racionalização do todo histórico e social que o engendrou. Dessa forma, o homem está sendo privado da compreensão, inclusive estética e artística, da sua existência enquanto sujeito histórico, o está sendo negada a compreensão da sua própria essência humana.

Evidente que o autor se debruça com mais profundidade sobre vários outros aspectos nesse artigo, entretanto, é sobre esses que opto no momento. Minhas reflexões não se esgotam aqui, elas se derramam e se desdobram em outros tantos pontos levantados pelo autor, mas por hora, acho que são suficientes para iniciarmos uma reflexão mais radical, que vai à raiz do problema, sobre a concepção de corpo, de dança e de arte que queremos construir, seja para revolucionar ou manter a organização societária na qual estamos inseridos.

SYLVIANE GUILHERME

[1] http://www.5ebem.ufsc.br/index.php

[2] http://www.5ebem.ufsc.br/trabalhos/eixo_08/e08b_t008.pdf


"O todo, as partes e a integração"


Entender e buscar uma dança que seja significativa, é um processo que demanda muito conhecimento de si e do ambiente o qual se está inserido. “Tudo se resolve no momento que acontece, é um presente que carrega história e aponta para o futuro, mas que se organiza a cada instante, criando novos nexos de sentido”. (GREINER, C. p. 80). A partir desta afirmação, podemos relacionar a busca desta dança que faz sentido para quem a realiza, com a Harmonia Espacial, criada por Laban a partir de seus estudos da “Arquitetura do Corpo”, numa relação harmônica. Ciane Fernandes cita em “ O Corpo em Movimento: o sistema Laban/Bartenieff na formação e pesquisa em artes cênicas:

“Na minha visão, três condições básicas são fundamentais para a Harmonia espacial. Primeiro, a profunda convicção de Laban na existência de uma ordem cósmica natural, que se reflete também no movimento. Segundo, a sua opinião de que espaço e movimento determinam-se mutuamente, estabelecendo que o vazio não existe. E terceiro, a sua crença na presença do movimento em todos os aspectos da vida, colocando que a estabilidade ou imobilidade completa não existe. Portanto o equilíbrio é o resultado de duas qualidades contrastantes de ação.” ( p. 178)


Ciane Fernandes afirma que a idéia de harmonia está presente desde o início na Teoria de Laban, indicando idéias de equilíbrio, proporção, em ser orgânico e natural, uma vez que o movimento faz sentido apenas se progredir organicamente.

Deste modo podemos dialogar com Peggy Hackney, analista certificada do movimento Laban/Bartenieff e que busca e explica como se dá a integração em várias esferas, para que aquilo que se dança seja significativo. Hackney utilza-se do termo “Polaridades” para fazer-se entender que o que está entre uma coisa e outra é o que faz com que a significação ocorra. A partir disso podemos conversar com a filosofia oriental que enfatiza que nenhuma das partes é mais importante do que a outra e que é o equilíbrio entre as partes que fazem o todo mais completo.

Visto que na filosofia oriental a busca do equilíbrio é constante, e enquanto existir um movimento constante na esfera do infinito haverá equilíbrio e harmonia -, ou seja, aquilo que está fora também está dentro e o que está dentro também está fora. O exemplo escolhido aqui para ilustrar este equilíbrio entre as partes é o Anel de Moebius. O Anel de Moebius ou Figura Oito (descrita por Rudolf Laban em termos de movimento, 1974, 98), as duas extremidades do tempo (passado e futuro) se encontram num ponto de inversão, criando uma torção sem interno-externo. Ao invés de ser uma progressão linear, o tempo do corpo é uma inter-relação retroativa tridimensional, do futuro para o passado invertido, re-criando o novo (FERNANDES 2000, 123-128). Este é o tempo paradoxal do corpo: quanto mais vamos rumo ao futuro, mais re-encontramos e transformamos o passado.

Dialogando com Peggy Hackney em “ Making Connections. Total body integration through Bartenieff fundamentals (1998), pode –se compreender que “integração” significa manter a integridade dos inteiros, os elementos que são essenciais de cada parte, enquanto também é possível ter a capacidade de coordernar os elementos separados, de modo que as unidades que formam trabalhem cooperativamente, afim de gerar um todo que se relacione.

O pensamento de Hackney se assemelha muito ao pensamento da filosofia oriental uma vez que para este povo nenhuma “parte” se sobrepõe a outra e as duas são de extrema importância para o entendimento do “todo”. Hackney cita as Polaridades e afirma que elas estão sempre conosco e que os opostos polares nos servem de forma útil para que possamos diferenciar. Ou seja, para conhecermos as partes, precisamos conhecer o todo, para conhecermos a imobilidade temos que conhecer a mobilidade, para conhecermos o simples, necessitamos compreender o complexo, e assim vice – versa em todos os exemplos citados anteriormente, de modo que só assim podemos valorizar as qualidades que emergem das parcialidades.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FERNANDES, Ciane. O corpo em movimento: o sistema Laban/Bartenieff na formação e pesquisa em artes cênicas. 2ª Edição – São Paulo: Annablume, 2006.

____________. Ciane. Pina Bausch e o Wuppertal Dança-Teatro: Repetição e Transformação. São Paulo: Hucitec, 2000

GREINER, Christine. O corpo: pistas para estudos indisciplinares. São Paulo: Annablume, 2005.

LABAN, Rudolf. The Language of Movement: A Guidebook to Choreutics. Boston: Plays, 1974.


Nalu da Rocha

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Samba e cultura popular

Tenho como foco para o decorrer deste texto, a cultura negra inserida no Brasil, a resistência do samba. Dos aspectos gerais, trouxa uma identidade cultural e nacional, buscando transparecer a mestiçagem e a afirmação da identidade negra no país.

Para entender o desenvolvimento cultural brasileiro, posto como foco o samba, precisamos entender e abordar a mestiçagem brasileira. Gilberto Freyre propõe em a Identidade Cultural, uma reflexão sobre os aspectos que caracterizam a mestiçagem trazendo teorias da hibridação cultural e discussões sobre a identidade cultural na pós-modernidade. Segundo André Stangl (2009), Gilberto Freyre propõe uma interpretação da miscigenação brasileira como o nascimento de um novo ser. Um ser que carrega múltiplos aspectos raciais e /ou culturais e que por descuido histórico estava renegando algumas de suas matrizes em nome de uma pretensa superioridade da pureza.

“o brasileiro crescentemente consciente de ser membro de uma sociedade e de uma cultura em grande parte tropicais, mestiças e não-européias. (...) Essa identificação implica o reconhecer-se ele homem, (...) mesmo quando em sua étnica não haja sangue ameríndio ou negro africano: ausência quase sempre compensada pela grande presença, no seu ser psicocultural, desse ameríndio e desse africano teluricamente tropicais” (FREYRE, 1971).

Para concretizar este pensamento sobre um corpo mestiço e afirmando de que nenhuma cultura é pura, aponto Stuart Hall que afirma: “em toda parte, estão emergindo identidades culturais que não são fixas, mas que estão suspensas, em transição, entre diferentes posições; que retiram seus recursos, ao mesmo tempo, de diferentes tradições culturais; e que são o produto desses complicados cruzamentos e misturas culturais que são cada vez mais comuns num mundo globalizado” (HALL, 2001).

Podemos perceber que a cultura brasileira se insere neste aspecto, e que o tempo-espaço também são coordenadas para estabelecer uma relação entre o permanecer e o decorrer de cada época, relevando fatores históricos e sociais não-linear: “Diferentes épocas culturais têm diferentes formas de combinar essas coordenadas espaço-tempo” (HALL, 2011).

Buscando este ponto da mestiçagem, podemos levá-lo a análise do samba e da cultura negra no Brasil, Helena Katz afirma que:

“um corpo que samba hoje requebra diferente do samba dançado a 40 anos, quando as relações entre carnaval e televisão não eram como agora, nem tampouco o contato entre morro e cidade. Com isso, a própria noção de como era o samba e o corpo que o sambava a 40 anos também se modifica, uma vez que é com o olhar de hoje que os lembramos”.( KATZ ).

Muniz Sodré trás em seu livro Samba, o Dono do corpo relações históricas do samba e sua construção de identidade nacional e afirmação da cultura negra no Brasil: “A resposta dançada de um individuo a um estímulo musical não se esgota numa relação técnica ou estética, uma vez que pode ser também um meio de comunicação com o grupo, uma afirmação de identidade social ou um ato de dramatização religiosa”.

Assim, entendemos que a mestiçagem é a afirmação, como o reconhecimento do outro, e a partir do outro é que faço as relações no mundo. Freyre afirma que “a mestiçagem configura-se como uma nova utopia de união, pois é por haver diferença que há igualdade, e a diferenciação sempre se dá ante ao que não é conhecido ou reconhecido”

REFERENCIAS

-FREYRE, Gilberto. Novo mundo dos trópicos. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971.

- HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de janeiro: DP&A, 2001.

- SODRE, Muniz. Samba, o dono do corpo. 2 ed- Rio de janeiro: Mauad, 1998.

Carina Maragno Trombim

"Palo tangos" na contemporaneidade: novas possibilidades

Através de rastros deixados pelos estudos sobre linguagens não-verbais, venho compartilhar minhas reflexões e pretensões em trabalhar com a questão da comunicação e a (in)certeza do corpo comunicante, pois trata-se de um tema que pode seguir diversos caminhos. Para dar início a este estudo, opta-se por adentrar na dança flamenca e a partir desta técnica específica pretende-se pensar em possíveis reorganizações corporais, por meio dos conceitos de corpo dilatado e expressivo a partir de uma abordagem contemporânea. Para ser mais específica, foi escolhido o palo Tangos para estabelecer estas relações. O tema inicial ficou: “A dança flamenca na contemporaneidade: possibilidades de reorganização corporal durante a execução do palo Tangos”. Esta pretensão de relacionar o flamenco com a contemporaneidade ainda está em processo de escolha de possibilidades, para definir o que desta contemporaneidade pretende-se relacionar.

“O flamenco é um estilo musical e um tipo de dança fortemente influenciado pela cultura cigana, mas que tem raízes mais profundas na cultura musical mourisca, influência de árabes e judeus. A cultura do flamenco é associada principalmente a Andaluzia na Espanha, e tornou-se um dos ícones da música espanhola e até mesmo da cultura espanhola em geral.”

“O Tangos constitui um ritmo bastante rico e versátil, existindo muitas variações em suas interpretações nas diversas regiões por toda Andaluzia. Como regra comum, o compasso quaternário bem marcado e o ‘cante’ usualmente alegre e festeiro”.

Considerar este corpo na contemporaneidade, emerge possibilidades de expressões na interação com a expressividade. Estabelecem-se aqui relações que deixam de ser entendidas como contraditórias entre corpo e mente, natural e artificial, vivo e gravado, realidade e imagem, sujeito e objeto.


Amábile Gabriele Bortolanza - Graduanda do 4º ano de Dança - FAP