quinta-feira, 23 de junho de 2011

MACROMU'DANÇAS' DE UM CORPO PÓS HUMANO MODERNO


3 INTER(AÇÃO) OU NÃO INTER(AÇÃO): EIS A QUESTÃO...

Segundo Lévy (2003), compreender o corpo e a dança no século XXI é compreender o imaginário da cibercultura: não só a desmaterialização, mas também as possibilidades textuais, a interatividade e a circulação (virótica) de informações por redes interplanetárias. E aqui adentramos na questão do virtual. Este artigo defende as idéias e teorias de Pierre Lévy, Gilles Deleuze, Félix Guattari, Jean-Louis Weissberg, entre outros, que afirmam ser o virtual “uma função da imaginação criadora, frutos de agenciamentos os mais variados entre a arte, a tecnologia e a ciência, capazes de criar novas condições de modelagem do sujeito e do mundo” (PARENTE, 1999, p. 14). Neste sentido o mundo das interfaces digitais é o lugar privilegiado das artes e em específico da dança, pois, constitui-se num ambiente de pesquisa por excelência e também representa, segundo Derrick de Kerckhove, uma metáfora tecnológica dos sentidos. “Com nossas mãos, nossos ouvidos, nossos olhos, e outros canais de ação e sensação, nós entramos em interação com o mundo, e estas são as relações às quais os artistas prestaram mais atenção desde o surgimento da arte” (KERCKHOVE, 1999, p. 59). Entretanto, o filósofo Jean Baudrillard parece discordar radicalmente de Lévy ao se referir à questão da interatividade. Enquanto Lévy defende a idéia de que a imagem (consideremos aqui a imagem corpo) perde a sua exterioridade de espetáculo para abrir-se infinitamente à imersão, convidando a platéia (usuário) à interatividade, à co-autoria da obra, Jean Baudrillard irá chegar ao extremo de afirmar que “não existe interatividade com as máquinas (tampouco entre os homens, de resto, e nisso consiste a ilusão da comunicação). A interface não existe. Sempre há por trás da aparente inocência da técnica, um interesse de rivalidade e dominação” (BAUDRILLARD, 2002, p. 117). Também no mesmo referencial de dominação e controle da rede podemos observar as alusões de Erick Felinto que, numa releitura de Virilio e Ken Hillis, irá afirmar: “o discurso tecnocientífico, ao se manifestar como religiosidade [refere-se a Lévy e outros ‘arautos’ da cibercultura] de uma época desencantada ou reedição tecnológica de credos gnósticos, faz desaparecer do horizonte do pensamento a materialidade e a corporalidade necessárias ao seu ancoramento no real” (FELINTO, 2003, p. 60-61). Ressalta ainda que, “por trás das utopias acríticas e dos desejos de imaterialidade esconde-se a possibilidade de uma tirania digital, que suprimindo de seus discursos o corpo, encontra assim, novos e sutis modos de controlá-lo”. Se para os filósofos tecnológicos positivistas, a arte digital na rede ou em aplicativos de Cd-Rom, procura levar ao extremo o potencial comunicativo e interativo da estrutura rizomática e híbrida do ciberespaço, para Baudrillard e Virilio esta interação e trânsito fluido entre autor e receptor, esta imersão interativa do espectador, anuncia não o apogeu da arte, mas a sua morte. “Quando todos se convertem em atores [pode-se por analogia considerar os coreógrafos – no caso da dança], não há mais ação. Fim da representação. Morte do espectador. Fim da ilusão estética” (BAUDRILLARD, 2002, p. 130). Previsões catastróficas à parte, não há como se negar que a cibercultura criou e continua a desenvolver uma arte híbrida, rizomática e interativa em que autor e público se misturam. E nestecontexto é preciso salientar a importância da interface como zona de contato entre homens e máquinas. A função da interface é a de traduzir, articular espaços, colocar em comunicação duas realidades diferentes. Parte-se do princípio aqui, contrariando Baudrillard, ‘o profeta do apocalipse’, que existe sim, a interface e que esta se traduz na interatividade e na virtualidade... Para Lévy (1999) a virtualização não seria a morte do mundo, mas o devir-outro do humano, propiciado pelas suas extensões maquínicas. Contra o negativismo exacerbado de Baudrillard, Diana Domingues (2003, p. 25) defende a tese de que a história nos mostra que as civilizações nunca voltaram para trás. Logo, “querer impedir o uso das tecnologias despender inutilmente nossas energias”. Segundo Santaella (2004, p. 58) McLuhan, foi sem dúvida o primeiro a se dar conta da extensão funcional dos órgãos sensórios por meio de aparatos técnicos ou próteses, embora tenha recebido inúmeras críticas. Assim das máquinas sensórias, passamos, hoje, para as máquinas cerebrais que de acordo com Lévy (1999), conectam nossas mentes em redes, na constituição de uma inteligência coletiva. O corpo, neste artigo, visto como uma ‘rede que tudo atravessa e que por tudo é atravessada' propõe a evolução cultural do ser humano, seu outro-devir, sediada no seu instrumento primeiro da arte: o próprio corpo. Considerando-se uma relação estreita e amigável (não catastrófica) entre e corpo e a tecnologia digital, pode-se afirmar que por simbiose (hibridismo) um surge e evolui no outro. Por isto é tão pertinente a idéia de um corpo híbrido ou como define Santaella ‘pós-humano’ a partir da relação entre dança e novas tecnologias; elas partem do mesmo lugar: o corpo. A dança digital permite interação. Segundo Parente (1999, p. 95) existem dois tipos de interatividade: “a primeira depende das diversas formas de relação hipertextual, que podem ser explícitas, implícitas ou arbitrárias. A segunda se faz em função das possibilidades que o sistema oferece ao usuário para interferir e transformar o texto.” É neste segundo caso, que o usuário torna-se co-autor do texto (obra de dança).

(texto de Cristiane Wosniak)


Beijo, Julyana Pinheiro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário